O fechamento de leitos psiquiátricos no Brasil, iniciado na década de 1990 e intensificado após a publicação da Lei 10.216/2001, tem gerado sérias consequências para o tratamento de pacientes com transtornos mentais graves. Embora a lei não determine o fechamento desses leitos, as portarias do Ministério da Saúde publicadas após a referida Lei, fecharam progressivamente esses espaços e determinaram direcionamento dos recursos para a abertura de serviços extra hospitalares. O que não ocorreu gerando uma completa desassistência.
De acordo com a psiquiatra e membro da Associação Psiquiátrica de Brasília, Apbr, Dilma Teodoro, a Rede de Atenção Psicossocial – RAPS, não cresceu na mesma velocidade que a desativação dos leitos, se mantendo insuficiente em todo o país, inclusive sem cobertura em todos os municípios brasileiros. “Os serviços comunitários não oferecem os cuidados para pacientes em quadros graves onde o tratamento ambulatorial não foi eficaz e há indicação de internação para cuidados intensivos”, aponta.
De acordo com a médica, há apenas 136 Centros de Atenção Psicossocial- CAPS, do tipo III, no Brasil, que são aqueles que disponibilizam leitos de retaguarda para cuidados de até 14 dias para casos graves, a maioria deles localizados em capitais. “Entender que todos os pacientes podem ser tratados ambulatorialmente é desconhecer a doença mental. O não tratamento adequado das doenças mentais traz consequências como o agravamento e cronificação da doença, levando a prejuízos profissionais, sociais e familiares, além de aumento do custo para o estado com benefícios e aposentadorias”, explica Dra Dilma.
Situação em Brasília
Ela destaca ainda que na capital federal, está sendo discutido o fechamento do único hospital psiquiátrico especializado que presta assistência ao DF e ao entorno, um prejuízo enorme para a população de quase três milhões de habitantes. Segundo a psiquiatra, o DF conta com apenas um CAPS III, que atende a região sudoeste, os leitos em Hospitais Gerais tem baixa taxa de ocupação por não ter equipe qualificada para o atendimento. Como consequência, os pacientes esperam por uma vaga de internação em Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), muitas vezes por mais de 7 dias.
Mas para que servem esses leitos? Para a especialista, eles devem ser entendidos como uma necessidade para casos graves,que não podem ser manejados em ambulatório e não entendidos como uma forma de punição. Afinal, a internação hospitalar é uma etapa essencial do tratamento de doenças mentais, similar ao tratamento de outras doenças crônicas como hipertensão e diabetes. “É fundamental combater o preconceito contra a doença mental e reconhecer a importância de um tratamento adequado e contínuo”, pondera Dra Dilma.
Ela acrescenta que o não tratamento adequado contribui para o agravamento da doença, a cronificação e o risco de suicídio. Portanto, o fechamento de leitos tira o direito do portador de saúde mental, em crise aguda, que necessita de cuidados intensivos, receber melhor tratamento. O agravamento da doença traz ainda transtornos profissionais, familiares, sociais e onera o estado com pagamento de benefícios e até mesmo aposentadorias precoces que poderiam ser evitadas com tratamento adequado.
Riscos à população
Dra Dilma reforça que os pacientes com transtorno mental em conflito com a lei, na sua grande maioria, apresentam quadros graves que não foram tratados adequadamente, seja por não aderência ao tratamento ou dificuldade de acesso aos serviços de saúde mental. “A RAPS não dispõe de estrutura para atender essa população, a equipe não é devidamente preparada para tal, em especial para atendimento dos quadros agudos, seja nos CAPS, emergências clínicas ou UPAs”, alerta. Conforme a médica, as consequências do fechamento desses serviços virão a curto prazo com desassistência e consequentemente novos delitos.
Além disso, a política de saúde mental vigente no país preconiza o tratamento comunitário e diz que quando houver indicação de internação que ela seja em hospital geral. Ela relata que há um aumento de internações compulsórias pela falta de leitos SUS no Brasil inteiro, tanto para tratamento de transtornos mentais como de dependência química. Em alguns estados elas são cumpridas mediante contratação de leitos em instituições privadas, onerando ainda mais os cofres públicos.
Teodoro aponta que é preciso rever a política de saúde mental vigente, com urgência, adequando à realidade nacional. Ampliando a oferta de ambulatórios especializados, CAPS, SRT, leitos psiquiátricos especializados para internação, serviços de emergência psiquiátrica. “Outra medida essencial é a inclusão de novas medicações psicotrópicas na lista de dispensação do SUS, além de disponibilização desses medicamentos na Farmácia Popular”, conclui.
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Raiane Wentz
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